O parintinense de raiz completou 80 anos de vida e não pensa em parar de compor: “É como um micróbio que pega na gente” diz o poeta das toadas antológicas em relação a compor músicas.
Por:
José Brilhante
Braulino Lima com seu instrumento de trabalho Foto: José Brilhante |
“Bate forte o tambor, eu quero é tic, tic, tac. É nessa dança que meu boi balança e o povo de fora vem para brincar”. Esse é um trecho da toada, sucesso mundial, que saiu da mente do pescador ribeirinho e simples, Braulino Lima. Ele cresceu brincando de boi, no Garantido, onde costurou as “barras” do touro branco com o mestre criador Lindolfo Monteverde, para brincar de boi nas ruas de Parintins.
Na infância além de se divertir na Vaqueirada
e Batucada, vendia frutas na rua para ajudar nas despesas de casa. Era uma
criança feliz, porque gostava do que fazia e ao mesmo tempo, buscava inspirações
para uma profissão que ainda na infância não planejava para seu futuro.
O
começo
Nasceu
em três de outubro de 1938, sendo filho
de Joaquim Paz de Lima e Rozalina Auzier de Lima. Devido as circunstância da
época, onde Parintins não oferecia oportunidade de estudo, chegou até o
terceiro ano do primário, uma escolaridade considerada baixa para quem acabou
se tornando compositor.
Nada disso o impediu, pois recebeu o dom da
música e, acabou desenvolvendo escrita e leitura. Como fazia parte do “mundo
boi bumbá”, com 28 anos compôs a sua primeira música, já uma toada que foi
aceita pelo Garantido.
“A minha primeira toada chamada Palavra de
Rei já entrou no Boi”, relata Braulino, cantando trechos: “Aqui
cheguei com minha rapaziada, vou formar roda pro meu boi se balançar, para saudar
as autoridades, e a minha galera que está sempre a esperar. Aqui estou, pois
não tenho preconceito, brinco com todo respeito, para nossos governantes! Eu
prometi e pra isso sou capaz, como diz o velho ditado: palavra de rei não volta
atrás”.
A veia artística veio com resquícios do pai,
que tocava algumas notas de violão. Porém, também aprendeu a tocar para
aperfeiçoar as suas composições que também chegaram ao boi Caprichoso com a toada
Tic, Tic, Tac ll, com letra e música totalmente diferente: “Vou levar meu boi na arena, pra morena eu vou levar. Ao som da
marujada, tic, tac, tic, tic, tic, tac. Esse rio, essa mata, essa selva. Esse
boi me faz balançar. Agradeço a mão natureza, Caprichoso e meu boi bumbá”.
A
inspiração do sucesso mundial
Estava
na sua profissão de pescador, viajando com o irmão Francisco Lima, pelo rio
Amazonas. Como de costume os ribeirinhos, buscam a água para beber, no meio do
rio, por ser mais limpa, devido a correnteza deixar a água em movimento. Nessa
jornada, Braulino olhou para um pedaço de terra na “beira” do rio e observou-o
caindo sobre as águas barrentas, sofrendo o processo chamado de terras caídas,
ocorrida nas regiões de várzea. Foi aí que começou a nascer a toada Tic, Tic Tac
com o trecho: “As barrancas de terras
caídas. Faz barrentas o nosso rio-mar. Amazonas rio da minha vida. Imagem tão
linda que meu Deus criou”.
Após esse acontecimento, retornou a Parintins
já com o refrão na cabeça e, começou a construir a letra para ser aceita e
gravada pelo boi Garantido em 1993.
Recebeu “chavecos” de amigos, quando
relacionaram a música como se fosse barulhos de relógios devido ao tic, tic,
tac da toada. O presidente da época Jair Mendes o chamou e indagou sobre o
refrão.
- Ei
Braulino essa toada não está muito pro lado do relógio? perguntou o presidente.
- Não
Jair, essa é pro pessoa pegar corda, respondeu Braulino com risos.
Mal sabiam eles, que a toada viria a vender
milhões de copias, anos depois de sua primeira gravação.
Banda
Carrapicho
A banda tomou conhecimento da toada no mesmo
ano, comprando os direitos de reproduzi-la por mil reais, e gravou em seu disco
de trabalho. Passou-se três anos sem expressividade, até que em 1996, a vinda do
produtor francês, Sayor, para o Amazonas, especificamente em Manaus, acabou mudando
a vida dos protagonistas da toada. O produtor, levou o CD do Carrapicho chamado Festa de Boi Bumbá para seu país, onde ficou a cargo de Patrik
Bruel, também Francês.
Foto: divulgação
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Braulino
assinou contrato com a gravadora Quatorze Produções, onde recebeu o convite
para ir até a França, para ver de perto seu sucesso em um teatro lotado. “Entre
eu a banda Carrapicho foi uma amizade”, fala o compositor com expressão de
felicidade no rosto, “inclusive a produtora responsável me levou para França.
Fizeram um trabalho bem feito na minha música”. Foi lá também que ganhou o
disco de platina por vender mais de oitocentos mil copias, em novembro de 1996.
Importância do boi Garantido e vida
atual
“O garantido
na minha vida foi tudo. Minha diversão maior foi brincar no boi”, diz o
compositor das toadas antológicas. Brincante das antigas, adora as tradições de
um boi que tinha seus ritos e crenças.
Sempre
exaltou a profissão de pescador, muito porque dela saiu as inspirações, vendo a
natureza amazônica e “transportando” em forma de poesias e rimas para suas
toadas.
Mesmo após
vinte e dois anos de seu sucesso mundial, ainda continua compondo, totalizando
mais de 80 toadas, gravadas e não gravadas. “É um micróbio que pega na gente, e
a
sensação de ouvir minha toada pelo boi sendo aplaudida e elogiada, é uma
alegria, e me ajuda, a não parar”.
Há outros
trabalhos particulares como boleros, forros e samba canção, mas, ainda
continua na paixão, a toada. Braulino foi uma exceção, onde o compositor fica
famoso e vive de direitos autorais, ou seja, do suor de seu talento que ainda
continua a praticar.