Foto: Arquivo pessoal de jornal
desconhecido
ALÉM
DE CICLISTA E CORREDOR, FICOU CONHECIDO COMO “HOMEM PEIXE”, DEVIDO SER NADADOR
DE GRANDES DISTÂNCIAS
Tudo começou em corridas pedestres quando
pediu um tênis ao pai. Em vez de atender os desejos do filho, trouxe uma bota
Sete Léguas. Onildo Filho (ainda não conhecido como ‘Homem Peixe’), e com
apenas 10 anos de idade, acabou questionando o presente. Após ouvir as lamúrias,
o pai o aconselhou dizendo que com uma bota pesada iria aprimorar sua força e
resistência nas corridas. E não deu outra, em 1972, o professor de Educação
Física, Aderaldo Qualhada, o descobriu como atleta. Com onze anos de idade,
Qualhada o levou para os jogos estudantis de Manacapuru. No decorrer da
competição ganhou quase todas as corridas na faixa de 18 anos, sendo que tinha
somente 12. Nascia ali, na pacata cidade do interior do Amazonas, o multiatleta
que viria ser conhecido nacionalmente e regionalmente pelas suas façanhas
esportivas.
No ciclismo, o segundo esporte que o
revelou para o mundo, foi um destaque. Atuou em muitas corridas em Parintins, Santarém
e Manaus, sendo campeão do Amazonas com apenas 15 anos. Na capital é tricampeão
da corrida Henrique Archer Pinto. Em desabafo contou que parou de correr de
bicicleta pela falta de incentivo ao esporte que diminuiu ao longo do tempo. De
10 corridas por ano passou a ter uma ou duas no máximo. Para uma pessoa
acostumada a competir, isso foi um desestimulo.
DEVOÇÃO E MILAGRE
Adoeceu em 1982, devido a uma pneumonia
grave que acabou destruindo seus pulmões.
Estava no auge da carreira como ciclista e já tinha ganhado muitas
corridas fora do Estado.
A notícia veio como um grande peso que
estava pondo fim ao seu modo de vida. Ficou muito triste quando foi proibido de
praticar qualquer esporte que exigia esforço físico. Na ocasião de exames, o
médico especialista em pulmões e formado nos Estados Unidos, perguntou o que
Onildo (o Homem Peixe) fazia da vida.
-Sou atleta - respondeu
- Então a partir de hoje, você pode
procurar fazer outra coisa da sua vida, porque qualquer esforço físico poderá
lhe fazer mal, você é uma pessoa descartável para o esporte – assim exclamou o
especialista em pulmões.
Naquele momento, o Homem Peixe, foi para
casa e se trancou no quarto em pensamentos, indagou como iria parar no auge da
carreira. Aí falou para si mesmo, “esse médico é muito bom, mas vou provar que
existe Deus e vou dar a volta por cima”.
Passou-se 14 anos desde que o médico o
atendeu. Já tratado, segundo Onildo pelas suas santas Teresinha e Nossa Senhora
do Carmo, foi correr em Barreirinha. E a pessoa que veio entregar o prêmio era
o doutor, aquele que o desenganou-o para o esporte. Quando pegou na mão do
detentor do prêmio, a vontade de se identificar era grande, de dizer que era o
cara morto para o esporte que tinha ganhado aquela fatídica corrida, mas não
falou, se conteve por causa das autoridades que estavam presentes no momento.
Porém, a TV Acrítica veio entrevista-lo e não aguentou, acabou contando toda a
história. No dia seguinte o veículo de comunicação estampou o acontecido nos
jornais.
Ao saber, o especialista em pulmões
chamou-o para outra bateria de exames, e nos resultados, a conclusão foi que a
única explicação seria um milagre.
Como forma de agradecimento, prometeu as
suas santas protetoras que iria praticar esporte até quando fosse possível, sem
temores ou qualquer outra coisa que viria a lhe desafiar no esporte.
UM SONHO PARA SE TORNAR O “HOMEM PEIXE”
A natação surgiu em 1996, literalmente no
sono profundo, em uma madrugada tranquila. Em relação a esse episódio Onildo Filho
relata: “eu estava na escada da igreja do São Benedito, aquela que desce para o
rio. Para mim tudo era real, e quando eu observei, vi sete nadadores descendo a
braçadas, vencendo as águas barrentas. Fiquei olhando aquilo, e quando eles
passaram, desci junto e os acompanhei. Aí me acordei daquele sonho, com a ideia
fixa de que eu poderia repetir aquilo, e por causa disso tive a ideia de
nadar”.
Começou a treinar, sempre com duas ou
três voltas, nadando no conhecido local chamado Cabo Rúbio. O tempo de
treinamento ia passando e as voltas aumentando. Quando percebeu seu talento
para resistir a tantos esforços físicos, resolveu unir as modalidades que
praticou durante a vida (corrida pedestre, ciclismo e o novo esporte natação).
TRAVESSIAS
Antes de cada travessia, elaborava um
projeto que incluía o percurso com as distâncias, datas e horários de saída e
chegada. Todos eram intitulados com o nível da façanha a ser conquistada. A
primeira, foi da comunidade do Boto para Parintins, com 53 Km de percurso,
totalizado com natação, corrida pedestre e ciclismo. Nessa primeira empreitada, obteve somente ajude de amigos, porque os
pretensos patrocinadores não concordaram, devido os perigos de uma jornada tão
ameaçadora.
A segunda foi do Caburi, sempre aumentando
a distância. Como já obtinha experiência, enfrentou
o rio mais uma vez. Completou o circuito com uma distância absurda para os
“mortais”. Onildo Filho (o Homem Peixe) nadou, pedalou e correu 126Km,
ultrapassando seu recorde pessoal até então.
Após desafios e mais desafios, o Homem
Peixe, não parou mais de testar seus limites.
A terceira jornada foi do Zé Açu, agora com um circuito menor, mas indo
contra a correnteza.
Como já tinha realizado tudo na cidade,
contornou Parintins duas vezes, só para testar seus limites, conseguindo bater o
próprio tempo em duas horas em relação ao primeiro contorno que completou em
12h.
O tempo passou e Onildo não parou mais,
se tornou um multiatleta, sempre querendo ultrapassar seus limites. No ano de
2000 fez a prova de Barreirinha para Parintins, nos moldes do triátlon. Também completou
o trajeto de Itacoatiara para Parintins, com um tempo de 36h. Suas façanhas
sempre despertaram o interesse da mídia. Ficou conhecido e fez matérias e
reportagens para vários meios de comunicação locais e nacionais ao longo de sua
carreira.
Foto; Folha do Povo, 2009
ABANDONADO EM 1998
O multiatleta era movido por desafios, e
quando surgia uma aposta para qualquer façanha o mesmo topava. Na ocasião a proeza era atravessar o Rio
Negro em Manaus, indo e voltando. A
equipe de apoio se prontificou a acompanha-lo para qualquer emergência. Porém
na troca dos profissionais que deveriam escolta-lo, já na volta, foi obrigado a
atravessar sozinho, sem apoio algum, porque já era noite e o rio estava muito
forte.
No meio do rio, a única direção era os
estouros e clarões dos raios que indicavam a direção. Quando olhou para o lado,
um cardume de Botos estavam boiando bem perto de seu corpo. O medo quis tomar
conta, escondia o temor bloqueando-o da mente. Em uma fração de segundos não
percebeu o animal muito próximo e acabou se chocando, com Onildo Filho (o Homem
Peixe) levando a pior. O Boto lhe acertou com a barbatana nas costelas, e para
piorar começou cair um temporal, só enxergava o outro lado quando os raios
trovejavam para indicar a direção. Nesse momento, vinha uma balsa, e um tripulante
acabou visualizando o Homem
Peixe e jogou um salva vidas.
-Bora rapaz, você se alagou? – falou o
tripulante
-Não, estou em uma competição- respondeu
Onildo Filho
- Competição? Cadê o resto dos
nadadores?
- Estão aí pra trás- afirmou
O tripulante olhou para escuridão e não
viu nada. Após alguns segundos o homem sussurrou.
- Esse cara é louco, está sozinho
nadando a noite no meio do Rio Negro.
A balsa acabou passando, mas a expressão
do balseiro foi somente de um balançar de cabeça, atestando como se fosse um
médico psiquiatra, a loucura de Onildo.
Com
muita dificuldade chegou ao seu destino as 19h;15min, com fome e cansado.
Foto: arquivo pessoal
OPORTUNIDADE
Os empresários da Coréia estavam sempre
em suas competições de ciclismo. Não percebia a presença dos estrangeiros e nem
imaginava os motivos de estarem sempre observando. No final de uma corrida, os
coreanos lhe chamaram para uma conversa particular no antigo estádio Vivaldão,
agora chamado Arena da Amazônia, localizado em Manaus. Logo que entrou na sala
de reuniões, os empresários fizeram a proposta de contrato, porque viram em
Onildo Filho algo incomum, que atleta algum possuía, ou seja, um talento raro que
poderia evoluir. Como era muito novo, a naturalização para representar o país
asiático foi abordado, devido a chance de adaptação ser grande.
Com a ingenuidade interiorana, ficou com
medo, mas aceitou, meteu o papel com endereços e telefones na costura do
calção. Acabou esquecendo, e na hora percebeu que a chance de mudar de vida e
elevar seu nível de atleta tinha se desfeito pela água que estavam jogando na
premiação da corrida de ciclismo. Assim a oportunidade desfaleceu-se com a
mistura de papel e chuviscos de água.
APOSENTADORIA
“Pendurou as barbatanas” na última
jornada, na prova mais difícil da carreira.
O desafio foi de Urucará para Parintins.
Sempre esteve em boa forma, mesmo
estando com seus 54 anos de idade. Mas, a batalha era direto, sem descanso,
ultrapassando noite a dentro. Caiu na água sábado as 13h40min e chegou domingo
as 8h30min. Ainda pedalou quatro voltas na Avenida Amazonas e correu até chegar
a linha de chegada.
Nunca parou totalmente de praticar
esporte, até sua precoce morte, com apenas 57 anos, no final de julho de 2019, devido um infarto!
ACERVO FOTOGRÁFICO
Fotos
do acervo pertencem ao arquivo pessoal de Onildo Filho, jornal Parintins em
Tempo, Amazonas em Tempo e Vandineth Pires
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