A convocação para Seleção Brasileira de handebol, ocorreu
quando passou para a faculdade de Educação Física. Os colegas, o pegaram e
rasparam sua cabeça como trote de iniciação! Aí foram duas emoções, aprovação
na universidade e convocação para o time nacional.
POR: JOSÉ BRILHANTE
Fotos: arquivo pessoal de Raimundo Inácio
Parintins, 1969 a 1972. Os pais ficavam em
frente às casas, nas calçadas para observar a molecada em horário de
brincadeira e, com Raimundo Inácio, o Piolho, com apenas sete anos de idade
não era diferente, seus pais, Jorge Pinto e dona Geralda, faziam a mesma coisa.
Como na época a televisão era só para os mais afortunados, a única diversão
era estripulias na rua.
A casa de Piolho era no centro de Parintins,
próximo ao Baranda. Não existia
muitas casas por ali, os terrenos eram grandes e cheios de árvores. Um prato
cheio para brincar de geral, barra bandeira e pular de galho
em galho. De noite, as aventuras continuavam. Com o passar dos anos, Raimundo,
aprimorou-se nessas atividades que exigiam o máximo de destreza e esforço
físico, só faltava canalizar para algum esporte. Os 10 anos que passou na
cidade foi uma escola para seu esporte de sucesso (handebol), que até então era
desconhecido.
O
apelido Piolho veio de seu primeiro técnico, Lúcio Albuquerque. Logo que
apareceu para treinar, todos especularam um codinome, porém quando o treinador
olhou para ele, viu um cabeção e o corpo franzino, e logo disse que parecia um
piolho. Desde então é conhecido no meio do esporte por este apelido.
CONVITE
PARA O HANDEBOL
Raimundo Inácio, o Piolho, saiu de Parintins com dez anos de
idade, devido a transferência de seu pai por motivo de trabalho. Ficou longe de
Manaus, cidade de onde é natural por este mesmo tempo, porque veio para ilha
tupinambarana recém-nascido.
Após voltar à cidade natal, conheceu o
handebol, através do convite dos irmãos. Era pequeno perto dos companheiros,
mas devido aos anos de treinamentos (brincadeiras de rua), todos os fundamentos
eram feitos com rapidez e habilidade em todas as posições, mas jogava na
armação esquerda e central.
Ainda na infância ficou conhecido como
bom atirador de pedras, que apanhava frutas no “toquinho”. Em uma das ocasiões
de viagem, enquanto estudante universitário, Raimundo Inácio precisou vir a
Parintins com a organização dos jogos escolares. Nessa ocasião encontrou um motorista,
conhecido da família, que lembrou dele e de suas habilidades na pontaria.
- Você não é o filho de seu Jorge, do
Banco do Brasil? Aquele que derrubava manga pelo cabo, sem ferir a fruta?
-Sim, sou eu - respondeu Raimundo Inácio
- Muito prazer, nem acredito, você está
muito diferente! – exclamou o motorista.
Ao
se despedir, o motorista, nem imaginava que esse talento, anos atrás, foi essencial
para o desenvolvimento no esporte, onde Inácio estava fazendo sucesso.
ATLETA
DE FÁBRICA
Logo foi notado pelas suas habilidades
e, aos 15 anos, após 36 meses de treinamentos no Olímpico Clube (time que jogou),
em 1977, Piolho, já fazia parte da primeira Seleção Amazonense
juvenil. Em 1979 na mesma seleção chegou as semifinais dos Jogos Escolares
Brasileiros (JEBs), em Brasília, Distrito Federal. Ao completar 18 anos, já não
podia mais jogar os jogos escolares brasileiro que vinha participando ano a
ano.
Ao saber das habilidades do jogador a fábrica
EVADIN, (produtora dos aparelhos AKAI,
AIKO, E MITSUBISHI), em 1979, contratou o jovem atleta
para competir nas Olimpíadas Operárias que se realizava todos os anos entre as
empresas de todo o Brasil, no mês de Maio. Em relação a essa competição Piolho
relata com muita nostalgia: “A cidade parava para assistir as competições. A presença
das empresas no dia da abertura, sempre em primeiro de maio (dia do
trabalhador), contava ponto para classificação final, era uma grande festa. As
empresas grandes, para reforçar suas equipes contratavam atletas para compor o
quadro de funcionários. Imagina cinco ou seis ônibus indo para a
torcida animar. E ainda deixavam o pessoal em casa após os jogos. Então era
assim o handebol na minha época em que jogava”.
Sendo assim, acabou se
profissionalizando pela empresa, ganhando salário somente para jogar no período
de 1979 a 1988. Era contratado como técnico de esporte, porém sua real função
era atleta de handebol. E como esportista oficial, servia também como garoto
propaganda da empresa.
Foi pentacampeão de 1981 a 1985 pela
Evadin. E por consequência a empresa tornou-se a vitrine de Raimundo Inácio, o Piolho, para Seleção Amazonense e para a seleção do Brasil. Mas, o fatores
decisivos para se destacar foram as habilidades que possuía e os campeonatos
brasileiros que disputou. Inclusive anos depois, em 1988, foi campeão
brasileiro adulto, pela seleção do Amazonas.
JOGO
INESQUECÍVEL
Universidade Federal do Amazonas (UFAM)
versos Senesc, nos Jogos Universitários do Amazonas (Juas-1988). Na ocasião
surgiu a necessidade de ser goleiro. Os cinco primeiros minutos foram tensos. Todos os arremessos que o adversário lançou foram gols, muito pelo nervosismo
que Piolho sentia no momento. O goleiro por um dia, relata como foi experiência
de ser defensor: “Depois que sofri nos minutos iniciais eu dei um tapa na minha
cara e disse pra mim mesmo: 'Ei rapaz, acorda! Está lesando é?'. Depois disso o
time se espertou para o jogo e piolho acabou defendendo três sete metros
(pênalti na linguagem do handebol), defendeu cinco bolas decisivas e ainda fez
sete gols em baixo das traves, ganhando o fatídico jogo por um gol de
diferença.
SELEÇÃO
BRASILEIRA
“Eu tinha entrado para faculdade de Educação
Física e, lembro que estava no aniversário de uma atleta de handebol. Os
convidados, sabendo disso, me seguraram e rasparam meu cabelo como em um trote
de iniciação. Na semana seguinte, chegou a convocação para Seleção Brasileira
de handebol. Foi uma emoção inexplicável, fiquei extasiado, foi para mídia e
tudo. Então foram duas felicidades: passei na faculdade e fui convocado, tudo ao
mesmo tempo”.
Piolho estava com 21 anos, na sua
primeira chamada, ainda era pra seleção júnior do Brasil. A equipe treinava
para COPA LATINA em Marrocos, mas, devido a eminente guerra civil no país, a competição
foi suspensa.
No ano seguinte em 1984 a convocação já
foi para seleção adulta, visando o campeonato sul-americano. Na ocasião sofreu
um choque de realidade. A seleção não possuía um investimento necessário para
se ter uma boa estrutura de treinamento. E ainda existia a falta de
comprometimento de alguns jogadores convocados de São Paulo que chegavam pela
metade dos treinamentos. Depois de uns 15 dias a lista de corte chegou e
Raimundo Piolho e mais alguns outros foram desligados do grupo.
DE JOGADOR A MESTRE EM EDUCAÇÃO
FÍSICA
A
partir de 1986 em diante, a crise financeira atingiu a indústria e, a Evadin
foi parando com os incentivos a modalidade e por consequência não participando
mais das competições. A escolha intelectual para si, foi devido ao pensamento
lógico que teve quando exercia a profissão de jogador. Um dia parou e pensou
que não sobreviveria o resto da vida jogando handebol. Como era contratado da
empresa só para ser atleta, obtinha de tempo para estudar. Fez o
Vestibular
pra Educação Física em 1983. Passou e começou na Universidade Federal do
Amazonas (UFAM) em Manaus. Formou-se em 1987. Um ano depois, perdeu o emprego
de jogador, mas já estava exercendo a profissão de professor. Em 2006 pela
universidade de Sorocaba, apresentou sua dissertação de mestrado, intitulada, OS
JOGOS E BRINCADEIRAS DE RUA, PULANDO MURO DAS ESCOLAS PÚBLICAS DE MAUÉS NO
AMAZONAS, que abarca justamente as brincadeiras de rua que o ajudaram no
handebol.
Em
três décadas de ensinamentos nas escolas e universidade, como educador, escreveu
dois livros, um com parceria de outros colegas e o outro com seu irmão, João
Bosco da Costa Pinto. O primeiro livro chama-se – Handebol: Aspectos
Pedagógicos e Técnicas - que relata a experiência de anos no esporte, desde a
história do esporte em questão, regras e treinamentos, escrito para o curso de
Educação Física da Universidade Estadual do Amazonas (UEA) em 2009. O segundo
foi em contrato firmado com a editora Valer, intitulado - Handebol: Reflexões
Didático-Pedagógicas e Técnicas - que demonstra quase o mesmo assunto, mas com
temas mais aprofundados, ou seja, os livros tratam do handebol em todos os
seus ensinamentos e fundamentos.
AVENTURA
POLÍTICA
A contribuição para o handebol como
jogador, treinador e dirigente, já não era mais suficiente. Chegou a amparar muitos
jovens em situação de risco social com o esporte e, devido a sua trajetória
esportiva vislumbrou a possibilidade de fazer algo em prol do esporte. E em
1996 acabou se candidatando para vereador em Manaus. Na campanha não possuía recursos,
e para driblar as dificuldades, colocou um som em seu carro e passou a chama-lo
de “piolho móvel”. Assim, começou rodar toda cidade de Manaus, com o slogan que
dizia: “Fique de olho, vote no piolho”. Não foi eleito, porém absorveu
experiência.
OLHAR
CRÍTICO DO MESTRE
“O grande problema não é só aqui em
Parintins, mas no estado todo. Não temos estrutura para trabalhar com o
esporte. Não existe um espaço que possamos utilizar com mais frequência. Temos
o ginásio Elias Assayag, mas é pago. De certa forma precisa fazer a manutenção
e nesse ponto até concordo com a cobrança de taxas.
No meu entendimento, incentivar o
esporte não é só dar a bola e equipamento para o pessoal jogar, é sobretudo
criar políticas públicas direcionadas ao esporte, que atenda a juventude
parintinense, criando programas esportivos com duração mínima de um ano, com a
avaliação, ocupando as praças esportivas da cidade com ações planejadas e com
profissionais qualificados”.
ENCONTRO COM O REPÓRTER PARA ESSA
BELA HISTÓRIA
Saí muito apressado, como um repórter
iniciante. Nem falo do transporte que uso pela necessidade financeira. Costumo
dizer que pratico o ciclismo forçadamente! Mas não é a minha história que
importa aqui. Vamos ao que interessa!
No primeiro encontro, só me restava 30
minutos de conversa, devido ao aluno que ia orientar-se sobre trabalho de
Conclusão de Curso(TCC). O mestre, outrora campeão de handebol, me esperava em
sua sala, sentado e tranquilo. Quando
entrei, cumprimentou-me com um sorriso no rosto. Logo pensei: "Irei sair daqui
com uma bela história para publicar!".
A conversa iniciou e, a felicidade de
relembrar suas glórias e tristezas para esse repórter que vos fala, era
aparente. O computador é a prova do “crime”, carregado de fotos e vídeos que
remontam os melhores dias de sua vida, como o mesmo fala. A cada registro que encontrava
no notebook, eram centelhas de lembranças que se materializavam quase que de imediato
para a felicidade do repórter.
Ao fim da entrevista Raimundo Inácio, na
segunda seção de diálogo, sempre com o carisma, mesmo depois de horas de
conversa, acaba revelando o apelido paralelo, Tom Gruise da floresta, adquirido
na universidade, devido a suas chegadas para dar aula, “disfarçado” com óculos
escuros.
ACERVO FOTOGRÁFICO
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Família Pinto
Seleção Amazonense
Seleção Amazonense no JEBs da Paraíba, 1978. Inácio é, o sétimo homem da esquerda para direita com 16 ANOS
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Lançamento de um de seus livros |
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Primeiro técnico: Lúcio Albuquerque
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