Ela usa a modalidade, com o apoio de muitos colaboradores, como ferramenta principal para tirar os jovens da periferia parintinense do caminho errado e transformá-los em cidadãos que irão contribuir para sociedade
POR:
JOSÉ BRILHANTE
Foto: José Brilhante
O amor fez o encontro entre Tia Nery e Parintins.
No ano de 1989, no auge da juventude, com 24 nos, conheceu um rapaz descendente
de japoneses, se casou com ele e veio para ilha. Mas, acabou se divorciando e
se instalou na cidade. Em nenhum momento pensou em voltar para sua terra natal,
Santarém.
Quando veio do Pará, não tinha em mente
trabalhar em prol as pessoas necessitadas por meio do futebol. Veio movida pela paixão, aquele casamento que
não deu certo, porém deixou a maior herança, seus três filhos, que são seus “braços”,
“pernas” e o sustentáculo do projeto Liberdade.
Chegou na cidade como Nery Pantoja Yoshii, mas,
logo que começou a filantropia, ganhou o codinome carinhoso de “Tia” Nery, um
agrado que é repetido por todos.
PROJETO
LIBERDADE
![]() |
Tia Nery, distribuindo alimentação para quem precisa no projeto Liberdade |
O
Liberdade nasceu há 15 anos atrás, pela necessidade de manter os jovens
ocupados, que chegavam do interior de Parintins para a ainda ocupação Itaúna ll.
Essas crianças ficavam sem alternativa de recreação e, por consequência ficavam
a mercê da criminalidade.
O estalido para iniciar o projeto que ocupa a
mente dos jovens com o futebol, e ainda doa alimentação para os participantes,
partiu da percepção de “Tia” Nery, que via os jovens sentados nas calçadas
sendo aliciados para o mal.
Primeiro começaram onde hoje é localizado o
campo do Gordo, mas, foram forçados a sair daquele espaço devido o julgamento
de pessoas que taxavam seus meninos de Galerosos (delinguentes).
Nesse tempo existia as tais galeras que se
confrontavam. Porém, eles a respeitavam muito. Devido a isso pensou: “Vamos
unificar tudo isso, fazer um grande movimento para desviar o foco desses
garotos”.
Esse pensamento de bondade foi crescendo
dentro da incentivadora social, para que o projeto se realizasse de vez. Pouco
tempo depois, inauguraram a delegacia, no bairro do Itaúna ll. “Ai fui com o
delegado e falei pra ele, sobre minhas necessidades do projeto. Ele me falou
assim, ‘tia a senhora faz o seguinte, procura fazer cursos que lhe deem
autonomia para trabalhar com as crianças, que lhe cedo o espaço para realizar
seu trabalho’”.
Ao todo possui oito cursos direcionados as
crianças e, até hoje tem o espaço ao lado da delegacia para ainda salvar vidas
que podem ir para o lado errado.
Havia uma ideia torta por parte dos garotos para
com a polícia, um dos órgãos que ajudaram a “Tia”, inclusive com o espaço onde
acontece o projeto Liberdade.
Imagem: Paulino Produções
Os jovens começaram a achar que a lei era a
parte opressora e, quando viam, saiam correndo, mesmo não cometendo delito
algum. Esse pensamento foi mudado ao longo do tempo, com a disciplina, ordem e
respeito que a precursora do projeto de futebol implantou.
Atualmente são 126 meninos pertencentes ao
projeto social, filhos dos filhos, sobrinhos e até primos dos que já participaram
do projeto. Durante toda a jornada de 15 anos, já passaram milhares de jovens.
“A
cobrança da sociedade é toda perante os jovens em situação de dificuldades. Mas,
eu te pergunto! Quem está fazendo alguma coisa para que essa situação mude? Por
causa disso, nasceu o Projeto Liberdade.” Nery
Pantoja
O
COMBATE PARA O FIM DAS GALERAS
As galeras eram união de jovens que não
tinham medo, e seguiam um líder e uma hierarquia para praticarem crimes. Dona
Nery percebendo isso, passou a ideia de que aquilo não levava a nada, somente a
prisão homicídio e roubo, e que o esporte poderia acabar com essas turmas fora
da lei.
Se “injetasse” a ideia que essas ações não
era necessário, o esporte poderia salvar muitas vidas. Aí surgiu a ideia de uni-los
para outro propósito, estudar e mudar o futuro deles. “Se eu fizesse uma
atividade que todos gostassem, como o futebol, poderiam mudar seus objetivos. E voltar a estudar para sair da marginalidade
era a alternativa. O analfabetismo era gritante entre os jovens da época, no
bairro” relata Nery.
Com o empenho perante o projeto e a luta para
conseguir estudo para as pessoas, a mentalidade dos jovens envolvidos em
galeras foram mudando. O tratamento era diferente, nada de expulsar os participantes
que reincidia no crime, e sim promovia a conscientização.
Dessa forma, o único grupo unido, era para praticar
esporte. A Porcada, X9 e a 14, já se reuniam somente para jogar futebol.
“Quando
você tirar seu tempo em prol de algo que pulsa, que tem vida, aí estará feliz. E
dentro de cada ser humano, existe o bem e o mal. Só vai roubar, matar e se
envolver em problemas, quando descobrir que não tem forças e nem achar coisa melhor
que aquilo.” Nery Pantoja
OS
NÃOS EM PROL DO LIBERDADE
Foram dores, sofrimento e sacrifícios. Se
colecionasse pedidos que deram em grandes nãos, já tinha uma vasta coleção.
Sempre recebeu resposta que não tinham tempo e não podiam ajudar. A resposta
por parte de dona Nery sempre foi cordial: “Sim senhor, muito obrigado e que Deus
lhe abençoe”.
As vezes faziam que ela esperasse por horas a
fio, cansando-a ao extremo, até fazer com que ela desistisse. Ficava com o sentimento
de magoa, mas, todo aquele sentimento de raiva e vontade de dizer o que pensava,
ficava guardado para não prejudicar seu projeto.
Todas as vezes que chegava em casa, após essas
recusas, não ajoelhava, caía ao chão chorando, e com todas as suas forças pedia
a Deus em oração: “Senhor até quando vou aguentar, por que as pessoas não abrem
as portas e dizem, ‘vou ajudar as crianças’. Será que tem tão pouco que não
podem doar um refrigerante, uma bola ou um pão? Quanta coisa jogam fora? Ninguém
é tão miserável que não possa doar nada”.
Desse jeito, os anos passaram e ao contrário do que se pensava, acabou
conseguindo colaboradores que ajudam. Ainda precisa de muito, mas
existem “anjos” que se solidarizam.
A
LUTA PELA VIDA E A CURA DE UM AVC
Em 2016, contraiu um Acidente Vascular Cerebral
(AVC), no meio do ano. Passou 19 dias em coma. Quando trouxeram-na para casa,
alguns movimentos do corpo não funcionavam mais. Perdeu as forças e quase toda
a memória. As lembranças se apagaram, como se estivesse apertado a tecla
delete.
Lembrou somente do projeto, de suas crianças
que poderiam não receber mais a ajuda de “Tia” Nery, por causa de suas
limitações físicas. Segundo o médico, só tinha 25% de chance de voltar ao que
era antes.
O que a salvou foram as crianças. Elas lhe
visitavam todos os dias, para que lembrasse dos rostos familiares. As
lembranças foram voltando e juntando como um quebra cabeça. Cada menino que
entrava para visita-la, fazia a singela pergunta: “Quando a senhora vai voltar?”.
Ela respondia: “Amanhã”. Sempre teve um AMANHÃ para Nery.
Logo que sentiu melhoras, em três meses, a
colocaram em uma “carrocinha” de moto, para acompanhar os treinos no Liberdade,
sentada em um banco, próximo ao campo para se sentir melhor e se curar. “Ai
veio o amanhã, os dias foram passando. Comecei a tomar banho sozinha, até ficar
totalmente independente de novo” relata Nery muito emocionada.
Por causa da doença parou de estudar. Porém
ao se recuperar, recomeçou, se formou no ensino médio, e agora está cursando
Letras em uma instituição de ensino superior.
![]() |
Nery recebendo uma homenagem honrosa da câmara municipal que a homenageou pelos seus serviços à comunidade. |
Nenhum comentário:
Postar um comentário