Ele nunca vem para os
corajosos e gananciosos. Os espertos acabam o encanto. Adiam o presente para
outro felizardo. O medroso é o escolhido, pelo dono do tesouro, que falecera
centenas de anos atrás.
Não existiam bancos por
essas paragens, nos tempos dos desbravadores da Amazônia. Os tesouros levados
por eles, na maioria das vezes eram enterrados. Quando uma grande praga dos
trópicos dizimava a colônia, todas as pedras preciosas e principalmente objetos
de ouro, eram esquecidos e engolidos pela floresta.
Francisca uma ribeirinha,
cresceu ouvindo histórias de encanto, onde o além enriquecia os compatriotas com
avisos: uma centelha de fogo indicava o local ou o dono vinha como demônio rolando
pelo chão, mostrar seu carma e o motivo de sua cólera depois de morto.
Acostumada a lidar coma
vida do interior, chica como era seu agrado, estava na gestação do quinto
filho e, trabalhava fazendo farinha até seus últimos meses de grávida. Tinha até
um ditado: “Filhos fortes e saudáveis,
começam a trabalhar ainda na barriga”.
Tempo vai e vem e, o último
mês para dar a luz ia chegando. Pelas dificuldades da idade, 35 anos, ela
acabou diminuindo sua carga de trabalho. Suas tardes ficaram para se refrescar
na rede, embaixo de um cajueiro na sombra. Aquele era seu deleite: conseguir pegar
no sono com um vento, sem carregar o peso do barrigão.
Ramos, o marido, acabou ficando mais ocupado, sempre trabalhando, mas ouvindo a esposa dizer que nos cochilos da tarde, escutava vozes lhe chamando.
- Uma voz conhecida me chama meu velho! Eu me desperto do leve
sono e olho ao redor, não vejo ninguém. Só os passarinhos cantando.
- É minha velha, tu já deve está caducando - falou o marido rindo, quando viu a cara de desaprovação da esposa. – Isso deve ser só impressão tua, te acalma, não deve ser nada - termia a acalmando.
Era só Francisca colocar
a rede, para os ventos trazerem a voz, entrelaçada pelas folhas
caindo, como se o ar fresco viesse como um alto-falante, que só ela escutava.
Mesmo com “vista grossa”
de Ramos para a situação (ele não estava acreditando muito), ela decidiu dar
uma espairecida. Viajou para casa da mãe, na cidade, e os acontecimentos sessaram.
Uma semana tranquila sem vozes a lhe aperrear na hora do sono. Mas, no instante
que chica voltou para o aconchego do lar, crente que estava livre das vozes,
elas voltaram.
Os olhos já iam se fechando quando escuta
de novo: “Senhora, por favor, me escute,
estou sofrendo, me ajude”.
Ela abriu os olhos de vez, tomou um grande susto, dando gritos descontrolados, toda se tremendo, parecendo que ia desfalecer. Mas, recuperou-se e viu que estava na frente de um jovem negro, com roupas feitas de sacas farrapentas, uma espingarda nas costas e um chapéu de palha, mais velho ainda.
Francisca não acreditou, reconheceu a voz de seus leves cochilos, esfregou os olhos para ver se o homem sumia. Mas ele continuava lá, pedindo ajuda, sem seu marido por perto. Ele certamente, se vesse, iria acreditar nela.
- Eu preciso me livrar desse carma, me liberta por favor. O meu Coroner, no leito de morte, deixou-me essa maldição, um tesouro. Eu nunca o encontrei, acabei com anos de minha vida procurando, até morrer! Me ajuda. Só me libertarei quando você encontrar. Agora eu sei onde está. Não sinta medo, sou o dono do tesouro, ele deixou para mim. Você pode me liberar dessa maldição e ainda ficar rica.
Nesse instante, chica ficou petrificada de medo, sabia que o homem não era real ou era um personagem das histórias que ouviu na infância. Mas, após ter certeza que aquilo estava acontecendo, fez o que jamais tinha imaginado, respondeu ao fantasma sofredor:
- Eu vou te ajudar. Onde está o que te aprisiona e não deixa você
ir?
- Está debaixo desse cajueiro, onde dorme todas as tardes. Você tem que tirar essa noite, mas faça sozinha - disse o fantasma desaparecendo.
Chica muito apavorada, meio atordoada, nunca que ia no meio da noite, grávida, cavar a terra com muito medo de fantasma, era capaz de abortar. Acabou esperando o marido chegar para lhe ajudar a ficar rica.
- Meu velho, estou com muito medo, me ajuda. Sabe aquelas vozes? Era uma visagem, ele está sofrendo e quer me dar riquezas.
Caído em si, o marido já
meio chateado, resolve tomar uma atitude: “Vamos
tirar o tesouro essa noite, como ele disse, para ver se é verdade”.
A noite caiu e lá estava chica e o
marido.
Com muita força ele
começa a cavar. Após alguns minutos, a ferramenta bate em uma caixa de madeira,
linda como nunca viu. Olhou para esposa e disse: “É aqui minha velha, acho que vamos ficar ricos”.
Na hora que abriu a tampa
de madeira, viu seus ouros e pedras preciosas, transformarem-se em carvões, tão
brilhantes que chegavam a ofuscar a vista. Ramos não acreditou. Uma fortuna, esvaiu-se
por suas mãos. Chorou copiosamente até perder as lágrimas e dar-se por convencido
que tinha perdido tudo, quebrando o encanto.
As riquezas eram para
Francisca, e não para ele. Só ela poderia libertar o fantasma do seu sofrimento
eterno.
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